“Serei um habitante do mundo, apesar do mundo”. G. Bachelard
Não seria os teus olhos um interstício do ser? Sim. Os meus não. Os meus têm o dom de metamorfosear o invisível. E abrir espaço. Quando metamorfoseiam no céu, nuvem por nuvem decresce disforme. As nuvens são disformes. O céu também.
No infinito de olhar os olhos habitam. Quando estrelas crepitam de luar, nuvens e pálpebras se quebram invisíveis. Na medida dos olhos teus, esta cosmologia seria apenas um olhar poético (cruci)fixo em um cobertor ralo de estrelas surradas, que protege debilmente o berço que sonha. Os meus não. Os meus fotografam memórias ocultas em manhãs de cinza.
Quando na Grécia, em um jardim qualquer, Nix envolta dos densos mantos espelhados dos orvalhos e de querubins malfeitores, anuncia em gestos pétreos as sentenças clarividentes da morte, meus olhos integram-se aos ecos ruidosos do universo em um coro ditirâmbico, enquanto o belo e o trágico metamorfoseiam-se confundidos.
Em teus olhos não existem elementos trágicos, nos quais comportem a sublimidade do belo. A não ser um retrato mal pintado da mulher de Ló, cuja vida doou por um último olhar. Mas o verdadeiro anelo da mulher de Ló não era a magia que se encontra em reflexos invisíveis de pálpebras abertas. Assim como Nix, anelava o belo imutável da petricidade.
Eis a profundidade dos olhos teus! Os meus não. O sintoma de olhar me cega, e adoeço de invisível.
Os teus configuram-se de pupila, metamorfoseando almas.