"A arte existe para que a realidade não nos destrua." Friedrich Nietzsche



sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Primavera em flor

                                                                                         para Rhalyne Moura


Um véu bordado sob o céu indeciso

reflete no grave perfume das horas
as frontes magníficas de um jardim verde-jade.

O doce-açucena de um aroma flor-de-lis
exala das folhagens nuas
dos pequenos fetos de copo-de-leite
a carícia branca de seus risos perfumados.

Orquídeas, acácias, lótus, azáleas
assomam na superfície celeste
cores secas e furtadas
como um tecido de sol.

Lírios e anêmonas
ecoam azuis no mármore do céu
como sílabas em flor
como pássaros celestes.

sábado, 23 de outubro de 2010

Fotografia


Um fosco disforme
recordações que se acendem
objetos ausentes que se movem
entre rostos desfolhados
empalidecidos pela simetria das horas
lembranças emolduradas
ressequidas pelo cansaço do tempo
tempo crispado pelas gotas  do sal
que se escoam pela madeira negra
em silêncio
pedaços de papéis quebrados
esquecidos
nas esquinas do tempo
dos laços malfeitos
e desfeitos
abrandados pelo calor das cinzas
de lenhos nervosos e gastos
e frios
em razão das fatias de neve que se escondem
pelas madrugadas vazias
e todas
inquietantes como areias movediças
que se instauram na superfície da alma
remoendo paisagens esquecidas
destacadas pela umidade dos dias
que se impregnam na matéria
e se tornam sangue.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Os Ossos do Ser



As raízes do nada
sob cortinas disformes da alma
impregnam-se nas cinzas do ser
o ser disforme
e o nada convertido em sal
o sal do ser
cortina de poros descortinados
ressequidos
estrelas decaídas
putrefatas
riscos niilistas
caracteres fétidos
a alma.

Palavras estarrecidas
matéria disforme
risos nefastos
e de contornos grávidos
paradigmas
sistemas
preâmbulos toscos
versos se completam nas barras das saias do tédio
o tédio de ser
aquilo descrito sob e sobre as mentiras

Desejo
aquele ócio
cinzento, macabro, agonizante
destrói o nada
destrói a grandiloquência
a grandiloquência do ser
irrompe na matéria
nas compilações precárias
do sublime
encarquilha as veias
do intelecto preso
aos troncos, aos poros, as entranhas
na subjetividade
daquilo que É.

O desejo
maníaco
manipula a alma
que cede as suas carícias plenas, impostas
adentra o ser
convida repressões contidas a ficarem
ora, penetram nos cômodos
de sistemas primários
magoando cicatrizes grilhosas
com impiedade
destrói o ser
destrói o nada
e o nada é tudo.


"Torna-te aquilo que és." Friedrich Nietzsche


A Coisificação do ser

Ora, pois.
Aquilo que é não deixa de ser.
O pó é o ser, o ser é o pó.
Pulvis es, et in pulverem reverteris.

Acerca do pó, aquilo que é se reduz a nada, porque é pó.
Mas não deixa de ser.

O nada é o ser, e o ser é tudo.


“Torna-te aquilo que és, [torna-te pó], cria raízes profundas dentro do nada, vira cinza e aprende a SER.” Friedrich Nietzsche